Cemitério do Estreito de Câmara de Lobos
O Cemitério da freguesia do Estreito de Câmara de Lobos situa-se no
Caminho do Cemitério e foi criado em 1921, altura em que tiveram lugar
as primeiras inumações. Com a sua entrada em actividade, seria
desactivado o primitivo cemitério da freguesia, construído em 1871 ao
lado da igreja paroquial de Nossa Senhora da Graça, em terrenos
expropriados ao respectivo passal.
Ainda que desde a sua
instalação, a 4 de Outubro de 1835, a Câmara Municipal de Câmara de
Lobos estivesse obrigada a dar cumprimento aos Decretos de 21 de
Setembro e de 8 de Outubro de 1835 que estabeleciam a imediata
construção de cemitérios públicos e proibiam as inumações nas igrejas
e capelas e, por esse facto tivesse de construir um cemitério em cada
uma das freguesias do concelho, relativamente ao Estreito de Câmara de
Lobos e, apesar das frequentes reclamações, até 1871, os mortos
continuaram a serem enterrados no adro da igreja. Em 1856, por ocasião
de uma epidemia de cólera, o pároco, perante a
falta de capacidade do adro para continuar a enterrar os mortos
reclama à Câmara a construção urgente de um cemitério na freguesia ,
situação que leva a Câmara a solicitar ao pároco que se dignasse
escolher um local que achasse conveniente para esse fim
[1].
Contudo, a situação ter-se-á
mantido inalterada uma vez que, em Setembro de 1862, a imprensa refere
que o cemitério do Estreito estava apresentando a maior indecência
possível
[2], repetindo-se a mesma denuncia em Julho de 1866,
onde a imprensa denuncia o facto da freguesia do Estreito ainda não
possuir um cemitério, estado o local onde se faziam as sepulturas
indecente e profanado, adiantando ainda que o padre Macedo, vigário da
localidade, por essa altura falecido havia sido enterrado no adro da
igreja
[3].
Ao que nos é dado supor, mais do
que financeiros, os problemas inerentes aos atrasos na construção dos
cemitérios prendia-se com a sua localização e eventualmente jogo de
pressões tanto por parte dos proprietários dos terrenos escolhidos e a
expropriar, para o efeito, como das populações residentes nas suas
vizinhanças uma vez que ninguém o queria por perto.
Apesar de, em 1836 ter
chegado a existir uma outra alternativa para a localização do
cemitério da freguesia do Estreito
[4],
a opção tomada em 1871, seria a da utilização de um espaço do passal
da própria igreja. Desta forma, em 18 de Janeiro de 1871, a Câmara
Municipal de Câmara de Lobos obtém autorização
do Governo, para efectuar uma expropriação, por utilidade pública de
uma área de 1000 metros pertencente ao passal da igreja paroquial de
Nossa Senhora da Graça e anexo a ela. Como justificação para esta
opção era apontado o facto do espaço em causa reunir as condições
exigidas para o efeito e de não se encontrar na freguesia nenhum outro
terreno com as características exigidas.
De acordo com o texto do Decreto
de autorização para expropriação de parte do passal, destinado a
cemitério: Sendo-me presente o processo instaurado e completamente
instruído nos termos da lei de 23 de Julho de 1850, sobre o
requerimento da Câmara Municipal do concelho de Câmara de Lobos, para
expropriação, por utilidade pública de 10 ares ou 1000 m2 de terreno,
pertencente ao passal da igreja paroquial de Nossa Senhora da Graça do
lugar do Estreito, para ali se construir o cemitério daquela
freguesia;
Considerando que a sobredita expropriação é reclamada pela necessidade
de estabelecer com os indispensáveis requisitos de salubridade o
mencionado cemitério;
Visto que o terreno escolhido reúne as mais importantes condições
exigidas para o efeito a que está destinada, não se encontrando na
freguesia nenhum outro preferível como se reconhece pela opinião dos
peritos e funcionários técnicos locais e pelas informações das
competentes autoridades administrativas, corroboradas pelo parecer da
Junta Consultiva de Saúde Pública;
Visto que a Câmara Municipal está autorizada e habilitada para pagar o
preço da expropriação e ocorrer às demais despesas da obra de que se
trata, orçado tudo na quantia de 1:2771$880 reis;
Hei por bem, conformando-me com o parecer interposto pelo conselheiro
procurador geral da coroa e fazenda, em conferência com os seus
ajudantes, declarar de utilidade pública a expropriação do terreno
acima dito para ser aplicado ao estabelecimento do cemitério público
da freguesia do Estreito de Câmara de Lobos, no distrito
administrativo do Funchal.
O Ministro e Secretário de Estado dos Negócios do Reino, 18 de Janeiro
de 1871.
Funcionou, o cemitério nesta
localização até sensivelmente 1925, altura em que, devido à sua falta
de capacidade que havia alguns anos se vinha sentindo, é substituído
por outro.
Essa falta de capacidade já se
fazia, contudo sentir, pelo menos desde 1906, altura em que a imprensa
dá conta de que auxiliada pela Junta Geral do
distrito, a Câmara Municipal de Câmara de Lobos tencionava mandar
construir um novo cemitério nesta freguesia, atendendo às pequenas
dimensões do actual e o elevado numero de habitantes que a mesma conta
[5].
Em Abril de 1913 a imprensa, surge
de forma reivindicativa a fazer referência à necessidade de se
proceder ao alargamento do cemitério do Estreito de Câmara de Lobos
[6].
Este mesmo problema viria também a merecer uma abordagem na sessão
camarária de 17 de Março de 1913.
Por volta de 1918, estando esgotada
a sua capacidade começaram-se a abrir covais em zonas onde há menos de
dois ou três anos tinham sido feitas inumações.
Esta situação desencadearia uma
onda de protestos por parte população que obrigou a Câmara Municipal
da Câmara de Lobos a ter de intervir no sentido de sanar o problema.
Contudo a solução não era fácil. Se por um lado todos, autoridades e
população eram unanimes em reconhecer a necessidade do aumento da área
do cemitério, já as opiniões se dividiam quanto às soluções
adiantadas: uns, cerca de 95% da população, no dizer da imprensa da
época, preferiam o alargamento do cemitério existente, alegando o
facto de quererem um dia repousar no mesmo campo onde seus irmãos,
pais e avós haviam sido sepultados; outros, alegando razões de ordem
financeira e representados principalmente pelas estruturas
governamentais defendiam a construção de um novo cemitério.
Ainda que pelo conteúdo de um
ofício enviado, em 1919
[7], à Junta Geral do Distrito perguntando qual o
percurso do ramal que iria ligar a estrada nacional nª23 com a igreja
do Estreito, a fim da Câmara poder proceder ao alargamento do
cemitério, esta tivesse pensado no alargamento do cemitério, como
seria de esperar, o poder adoptou, como solução para resolver o
problema, pela proposta que defendia e procurou, para o efeito, um
local adequado e afastado das habitações. Contudo, como não o tivesse
encontrado, resolveu adquirir uns terrenos cultivados a vinha, pouco
distantes da Igreja, e perto de diversas habitações e onde começou a
fazer inumações, cortando a vinha conforme tinha necessidade de espaço
[8].
A 1 de Setembro de 1921, um órgão
de informação denuncia o facto de poucos dias antes terem sido
sepultados fora do cemitério, no terreno de um particular sem
autorização deste, os cadáveres de 4 indivíduos falecidos
[9].
Contudo, no dia seguinte o mesmo órgão de informação rectifica a
noticia dizendo que as covas afinal tinham sido abertas num terreno
que já estava destinado a cemitério.
Neste período inicial, terá mesmo
chegado a haver uma tentativa para reservar o “poio”, como era
conhecido o novo cemitério, para os pobres, aliás, ainda hoje, este
recinto é conhecido por Poio do Bichete, enquanto que os ricos eram
enterrados no antigo cemitério, mesmo que para isso fosse necessário
abrir covais recentemente fechados
[10].
Aliás segundo a transmissão oral, parece que o próprio pároco terá
defendido este tipo de comportamento, que no entanto não terá sido bem
aceite. Com efeito, ter-se-á verificado a 15 de Janeiro de 1922 uma
destas situações e o correspondente local do Diário de Notícias
adiantava que se a situação se repetisse poderia originarem-se
situações de zaragata
[11].
A opção pela construção de um novo
cemitério, em lugar da ampliação do então existente, como era desejo
da população, viria a desencadear uma forte oposição popular,
traduzida quer em exposições feitas ao Governador Civil
[12],
[13],
[14]
e à Câmara Municipal
[15], quer ainda numa campanha extremamente bem feita na
imprensa, por parte de importantes proprietários, e num levantamento
popular que arrastaria até à sede do concelho cerca de 200 pessoas
[16].
No dia 7 de Junho de 1922, dia de
sessão da Comissão Administrativa da Câmara Municipal, cerca de 200
pessoas, incluindo homens, mulheres e crianças, deslocaram-se desde a
freguesia do Estreito até à vila de Câmara de Lobos, onde por volta
das 12,50 se reuniram em comício, para pedirem à Câmara que não
fizesse o novo cemitério mas antes alargasse o existente. Era o
reforço do seu abaixo assinado remetido à Câmara a 24 de Maio de 1922.
Nessa mesma ocasião foi presente à
Câmara uma representação, com um grande número de assinaturas, que, na
ausência de qualquer um dos elementos da Comissão Administrativa,
apesar de ser dia de sessão, foi recebida pelo Secretário
[17].
A 26 de Julho de 1922 teve lugar a
arrematação da obra de construção do novo cemitério do Estreito de
Câmara de Lobos, tendo sido de 36.066$79 a base de licitação
[18].
Em Julho de 1922, portanto já
depois do anúncio da arrematação das obras de construção do novo
cemitério, Joaquim José da Silva, um importante proprietário no
Estreito de Câmara de Câmara de Lobos havia conferenciado com o
Governador Civil sobre a construção do cemitério da freguesia, que
cuja solução não agradava a maioria dos habitantes da freguesia que
prefeririam o alargamento do antigo. Como argumentos, alegava que o
local destinado ao novo cemitério, para além de se situar próximo a
habitações , também se localizava um num esplêndido sítio que estaria
destinado a futuros estabelecimentos de turismo
[19],
[20].
Aliás, em 1933, estas mesmas razões
terão levado, ao que julgamos a uma nova tentativa de transferência do
cemitério para outro local, sendo este entre outros, um dos
melhoramentos pretendidos para serem realizados na freguesia do
Estreito, e que levou mesmo à nomeação de uma comissão de estreitenses,
presidida pelo Dr. Juvenal de Araújo com o fim de pugnar pelos
interesses locais[21]
[15] Diário de Notícias, Funchal, 25 de Maio de
1922.
[17] Diário da Madeira, Funchal, 11 de Junho de
1922
[20] Ver também Diário de Notícias de 1 de Agosto
de 1922 e de 3 de Agosto de 1922 (importante).
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